domingo, 10 de outubro de 2010

Quinto capítulo – mais encontros

Catherine e Alicia
Elas sentaram-se à mesa e começaram a almoçar. Ou tentar. A conversa não parava. Até falar de boca cheia foi necessário para que não houvesse silêncio naquela mesa de vidro. Risadas, momentos sérios se seguiram. Alicia por uma tarde parecia esquecer do que houve na noite anterior. Uma tarde com gosto de torta de chocolate, que foi apreciado por todas. Até pelas as duas meninas com mania de “light”.  Até que Alicia fala de paixão e de como é difícil estar apaixonada.  
Al:       - Maninha do meu coração, não existe paixão entre pessoas.
Alicia: - Como não? O estado de paixão é o exagero de todo sentimento. Tanto o ódio, tanto o amor.
 Al:       - Sim. Mais por ser exagero ele engana. Tudo que é exagerado tem ar de falso.
Alicia: - Lógico que não. Pode ser exagerado e verdadeiro. Pelo menos quando ainda se sente apaixonado. Eu fui e sou apaixonada pela Vanessa.
Al:     - Você é apaixonada por uma ilusão. Você criou a Vanessa na sua mente. Uma Vanessa honesta, lésbica, inteligente, bonita etc. E ela é safada, sem vergonha, infiel, heterossexual, burra e não é tão bonita assim. É muito branca. Parece um palmito gigante. Você criou uma paixão por alguém que não existe.
Alicia: - Por que você a acha burra?
Cat:    - Essa até eu respondo. Eu não conheço essa tal de Vanessa, mas trocar você só pode ser um ato de burrice.
 Al:      - Concordo com você, Catherine. Mas existem mais coisas. A menina namorava um cara há um ano. Cheia de amor para dar. E pela cara dela, dava… E como dava. Enfim. Daí ela resolve terminar com ele e pouco tempo depois começa a namorar uma mulher. Algo que ela nunca tinha feito. Ou é burra, ou muito esperta e estava se aproveitando de minha irmã.
 Alicia: - Não é bem assim. Ela está confusa. Ela é bissexual.
 Al:       - Irmã. Você é uma mulher bonita e experiente. Tem vinte e cinco anos e cai nessa de confusa? Não acredito.
Alicia: - Você é muito cética em relação às mulheres.
Al:       - Cética em relação a todas as pessoas, independente de sexo, cor, credo, orientação sexual, time de futebol, nacionalidade ou cor de esmalte. Os seres humanos podem ser diferentes em vários aspectos, mas em um são iguais. São todos estranhos.
Cat:     - Estranhos em que sentido?
Al:      - Ai caramba… Pessoas são estranhas. Mentem, corrompem, vendem. Pessoas transam com cactos, cachorros, cavalos… Você não vê um elefante cantando uma girafa, né? Pessoas são bizarras, nunca estão contentes, sempre apressadas, fantasiam demais, criam problemas para achar soluções, mas os problemas estão grandes demais. Pessoas são estranhas, criam ilusões e se dizem desiludidas… cometem crimes, e dizem que foi em nome do amor. Querem provar uma para as outras, dos os inícios dos tempos, quem é o melhor, quem está mais certo, e nem se tocam que todos fazemos parte da mesma bosta.

Alicia: - Minha irmã e suas teorias e teoremas.

Cat:     - Faz sentido o que você diz.

Alicia: - É, mas todos os sentidos não são exatos. As pessoas são estranhas, mas se não fossem estranhas não seriam pessoas. O mais legal do ser humano é a sua estranha complexidade.

Vero: - E se tornam ainda mais estranhas quando sentem alguma necessidade. Principalmente quando esta necessidade é do simples amor.

Cat:  - O elefante não canta uma girafa, mas nós também não cantamos um hipopótamo.

Al:    - Mas tem muita gente que transa com animais. Um cavalo, cachorro.

Alicia: - A mula não é o cruzamento de jumento com égua?

Al:    - E daí?

Alicia: - São espécies diferentes. Assim como o cavalo e o homem.

Al:    - Você está comparando o sexo entra um jumento e uma égua com o cavalo e o homem?

Alicia: - São espécies diferentes. Um eqüino com um asinino. E uma égua é estranha? Um jumento é estranho?

Al:    - Mas a mula é. E a estranheza do ser humano vai além do sexo. Você já viu algum animal desiludido?

Vero: - Mas o ser humano é um ser pensante, têm consciência, os outros animais não.

Al:    - E você acha que pelo fato de ser inteligente, o ser humano pode inventar ilusões e acreditar nisso? A situação não existe. Ou melhor, a pessoa que a pessoa se apaixona é de uma forma. Sempre foi daquele jeito. Mas o ser humano acredita que ela pode ser de outra forma e quando percebe a merda que fez se diz deprimido e desiludido. Bem feito. Quem mandou inventar uma pessoa dentro de outra.

Cat:  - É por causa da paixão.

Al:    - Eu não acredito na paixão entre seres humanos. São sempre ilusórios.

Cat:  - Nossa. Você não acredita mesmo nas pessoas.

Al:    - Eu não acredito mesmo. Sou completamente incrédula quando se trata de seres humanos.

Alicia: - Pois é. Acabamos voltando a falar sobre que já havia começado: A paixão.

A paixão. O exagero dos sentimentos. O ápice do que está sendo envolvido. Amor? Ódio? É tudo. Paixão, não tem como explicar. E nesse ritmo psicológico e filosófico com algumas risadas no meio a conversa se desenrolou até as cinco horas. Alicia e Catherine decidem ir embora. As duas se despedem das anfitriãs e entram no carro e voltam para o bairro das duas meninas. Cat estava contente por estar ali e percebeu que era o momento exato de começar a chegar mais perto da linda menina que está ao volante.

- Alicia, bem… assim… eu não consigo não lhe fazer um elogio, pois, você é linda demais. E além de linda é inteligente, divertida. E eu adorei passar esta tarde com você.

- Obrigada pelo elogio. Também gostei de estar com você e te conhecer melhor.

- Estranho, não é? A gente se conheceu ontem e estou aqui no seu carro. Conheci a sua irmã, sua cunhada. É como se do nada alguma coisa criasse esta intimidade.

- É mesmo. Você é ótima pessoa. Educada, inteligente, curiosa, atraente.

- Não sei se devo…

- A sua rua é a próxima, não é?

- Isso mesmo. Segue reto e vira a próxima a esquerda.

- Desculpe, te cortei. O que você ia dizer?

- Nada de importante.

- Fala. Mesmo não sendo importante. A sua voz é bonita, pode ser ouvida até mesmo se for escutar uma asneira.

- Obrigada. Bem… eu ia dizer que…

- Desculpe te cortar de novo, mas é este o seu prédio, não é?

- Sim, sim. É esse.

- Pronto está entregue.

Neste momento Alicia tira o cinto de segurança e olha bem para Catherine e pede com um jeito sedutor para que a moça termine a frase. Cat acredita que pode conseguir que a moça faça o que ela deseja pedir.

- Assim… Eu queria muito pedir para você subir comigo. Ir ao meu apartamento. Para a gente tomar um café. Isso. Quero te convidar para tomar um café comigo.

- Lógico. Vou subir com você. Só vou estacionar melhor aqui, tudo bem?

- Tudo certo.

Um olhar despertado pelo o acaso encontra as duas moças saindo do carro e entrando no apartamento. É Vanessa. Seu olhar ciumento mistura com o seu ar incrédulo. Acreditava de fato no amor eterno de Alicia, e agora ela sobe em um apartamento com outra garota. Ela queria subir junto. Entrar no prédio. Gritar com Alicia palavras como “O seu amor é meu. Eu não te amo, mas ainda te quero. Sinto saudade de nosso calor. Quero que a sua boca seja somente minha”. Mas ela não entrou no prédio, não gritou e, apenas, foi embora dali. Não sabia o que fazer. Ou talvez saiba.

Enquanto isso, no apartamento de Cat, a cantora prepara um café e entrega para a outra artista, que elogia a forma de fazer café da dona da casa. Catherine senta bem perto da menina de olhos claros, pega o violão e toca Bizarre Love Triangle, o que cria certo clima. Alicia termina o café, coloca em cima da mesinha e se aproxima ainda mais de Catherine. A canção pára, as duas bocas se aproximam, uma sente a respiração ofegante da outra. As bocas nem se tocaram e já podiam sentir o gosto.

O telefone de Alicia toca. É Vanessa.

Alicia vira o rosto. Justo este rosto que é beijado, sem querer, por Cat. Sem querer não pelo beijo, mas por ser no local errado da face que ela queria beijar. Alicia olha para Catherine e atende ao telefone. Vanessa diz que elas precisam conversar. Alicia diz que elas se encontram em frente ao seu apartamento. Cat olha o fato com olhar de criança que perde o brinquedo preferido. Elas se despedem e Alicia se vai.

***

Bruna
        Estava alegre e saltitante a mesma que fizera o caminho contrario triste e com raiva. Por causa de uma simples conversa conseguiu deixar de lado seus problemas e se concentrou em situações muito mais agraveis e simples. Sabia que iria ter que enfrentar as duas garotas de sua vida (ou que eram de sua vida), mas isso não é um problema para cada segundo. E de verdade nem é um problema dela, e sim das outras que estão clamando pelo seu perdão.
        Ela prestava atenção na praia, nas pessoas, nos postes, carros, nas crianças, nos ciclistas, em tudo. Tudo em sua volta parecia encantador. O homem que vendia sanduíche natural, o garoto andando de skate na rua, o carro cor vinho que passava. Tudo, mas realmente tudo ficou mais lindo. É como se o que estava preto e branco ficasse colorido, e não somente cores diversificadas… eram cores fortes e vivas. Ela descobriu que podia ser forte.
        A força da alma pode ajudar a se orientar em caminhos dentro de si, que, talvez, nem era conhecido por ti. E foi isso que acontecera com Bruna, ela descobriu a alegria, após a infelicidade que estava a atormentando horas antes.
        Mas em um minuto ela resolveu pensar em Lígia.
- Será que aquela louca estava sendo sincera?
Às vezes a verdade pode aparecer disfarçada de mentira. Uma verdade que está tão escancarada na sua frente, quase entrando pelos olhos, pode lhe parecer uma ilusão de uma boca enganosa, olhos cortantes e língua afiada. Era assim que era a nova visão de Bruna sob Lígia, com estes exatos detalhes.
- Mas e se for verdade? E se ela me ama?
Perguntas disparavam na mente de Bruna como uma metralhadora de palavras. Não sabia como controlar isso. A sua alegria ainda estava ali, as a curiosidade para descobrir a verdade estava já começando a querer criar raízes em sua mente. Se for verdade, Lígia é louca. Se for mentira, é a pior desculpa esfarrapada que ela já escutou em sua vida. Enfim, para que tentar queimar seus neurônios com uma louco-mentirosa? Lembrou da alegria de Bruna. O jeito de ela falar, andar e sorrir. É uma forma incomum. Uma pessoa incomum. Do tipo que parece que nasceu para fazer as pessoas sorrirem. Hoje em dia pessoas assim são raras.
Pensou tanto que chegou a sua casa antes que o comum. De verdade ela nem ligou se estava longe ou perto. Chegou, subiu no elevador, abriu a porta e abraçou o irmão. Depois beijou os pais. Estava alegre. A mãe perguntou para ela o que Lígia veio fazer tão cedo. Conhecia a amiga da filha e achou estranho ela acordada tão cedo. Bruna sorriu e falou que a amiga é uma louca.
Almoçou e saiu de casa para ir de encontro com Luciana.

***

Monise
Passar tempo com seus pais. Algo que Monise há bastante tempo não fazia. Eles ficaram felizes. Acharam que a partir dali tudo seria como antes. Uma alegria contagiante tomou conta deles. Foram em uma loja esportiva, compraram uma espada e pegaram endereço de um lugar onde tinha aulas de esgrima. Depois foram almoçar. Monise comeu bem, algo que ela não fazia desde que entrou em depressão. Não sorria, mas em certos momentos esboçava um sorriso. Comeu até uma sobremesa de pêssego. Olhava o jeito entusiasmado de seus pais. Percebeu o quanto aquelas ações dela os faziam bem. Ela queria ser feliz, mas algo a incomoda. Algo que ela não diz a ninguém, que a faz ter raiva das pessoas. Que a faz ser incompreendida. Algo que dói por dentro e que nenhum psicólogo, psiquiatra, amigo, pai, parente, ninguém conseguiu descobrir o que é que tanto a incomoda. Algo que está dentro dela, e que parece que ficará por lá por muito tempo.
As suas ações e reações pareciam programadas. Como se ela estivesse tentando fazer o que seria certo para dar um pouco de felicidade aos pais, mas não estava sendo honesta consigo mesma. Ela pensava muito em Luciana, a forma de ela buscar a felicidade nas pequenas coisas da vida. E por que não tentar?  Mas tudo lhe parecia falso. Até mesmo a sua tentativa de tentar mostrar felicidade, era mais falso que uma nota de três reais.
Ela pegava a espada e brincava. Talvez, nesta brincadeira, ela se sentia mais honesta. Estava quase sendo uma mosqueteira. Fingia que ia dar uma espadada em seu pai, que sorria e pedia, em tom de brincadeira, para que ela não o matasse. Guardou a espada. Iam entrar no carro. Os pais cheios de expectativas. Monise com vontade de tentar mais uma vez. E quando se tenta ser feliz, trava-se uma guerra consigo mesmo. E esta guerra Monise lutaria com uma espada de esgrima. Só faltava agora o seu cavalo branco.
O cavalo branco em sua vida não seria de fato um animal. Um cavalo de um herói é o seu companheiro de batalhas. Um fiel que lhe ajuda ir além. Desafiar os perigos e ir mais longe mais rápido. Era uma guerra que não era santa, não era por amor, nem por dinheiro ou terras. Era um desafio que ela decidiu enfrentar. Só não sabia por quem era. Qual é a mocinha que está presa na torre do castelo. Talvez ela seja esta mocinha, dentro de seus sonhos alienados, porém, pode ser seus pais. Na tristeza da prisão causada pela solidão e vontade de não viver da filha. Ou talvez a mocinha seja alguém que tenha encantado seu coração. Talvez ela queira arranjar uma forma de deixar seu coração com a possibilidade de felicidade para poder vir a amar. Não tem como amar antes de ser pelo menos um pouco feliz. O infeliz não encontra o amor, e sim a doença.
Seu sorriso mentiroso, dentro de sua própria compreensão, era uma espécie de escudo momentâneo. Uma forma que ela iria se defender daqueles que abominam os olhares tristes e depressivos. As pessoas agora iriam ver um sorriso, mesmo que por dentro ela não estivesse sorrindo. E a imagem pode valer mais que mil palavras. Ela já havia passado à primeira impressão. Menina triste. Era assim que as pessoas falam dela. “Lá vai aquela menina triste.”; “Será que vai tentar se matar novamente?”; “Ela dá muito trabalho aos seus pais”; “Ela procura tanto a própria morte, que um dia ela a encontra.”. Estas frases ela escutava quase todos os dias em seu prédio e na escola. Os colegas de sala se mantinham distantes daquele ser incompreensível.  Ninguém entende uma pessoa que desisti de morrer. Todos acham que mesmo a vida sendo ruim, tem que se buscar um motivo para ela ser boa. Um motivo para sorrir. Mesmo que este motivo seja o mais egoísta de todos. Dinheiro é um destes. Se não existe um real propósito de vida, a vida de luxo acaba se tornando um bom motivo para que muitos queiram continuar vivendo.
Outro motivo é o amor. Qualquer coisa que possam chamar de amor. O ser humano é um ser que vive de imagens. Precisa criar imagens para si. Amor por uma religião é um símbolo, pois, mesmo que se acredite em santos, anjos, Deus, deuses e outras coisas, não é nada concreto. Amor pelos filhos, talvez seja o mais digno dos amores, pois ele é o mais sincero, porém, é quase um amor narcisista. Pois, apesar de seu filho ser uma pessoa diferente de você, ele é um pedaço seu, uma continuação sua. Não é tão difícil amar este pedaço de você. E o outro amor. Por uma pessoa que não tem um vinculo. Alguém que você olha e tem vontade de passar o resto de sua vida ao lado dela. É o amor mais perigoso de todos. É o amor egoísta. Você não quer dividir esta pessoa com mais ninguém. É um amor que te fez duvidar, sofrer, chorar, gritar, fazer loucuras e te extrai inúmeros sentimentos. E é por querer sentir este amor que Monise que poder voltar a sentir.
Os símbolos podem enganar, machucar. Mas podem salvar um coração que precisa acreditar em algo. O simples fato de acreditar em alguma coisa, já contribui para se viver. Por isso que muita gente acredita em alma gêmea e em anjos. Talvez eles realmente existam. Quando se realmente acredita em alguma coisa, essa coisa acaba por existir de fato.
Monise não acreditava em nada. Passou a acreditar em nada. Agora ela quer acreditar que pode ser feliz. Mesmo que a felicidade seja mais uma idéia do que uma realidade.
Eles chegam em casa. Monise vai a seu quarto e pega o celular. Resolve ligar. E liga.

***

Luciana
        Ela disse que iria para casa almoçar. Até pensou nesta possibilidade, mas ficou realmente preocupada com a reação de seus progenitores. Não que realmente fossem enviá-la para o Iraque ou Afeganistão, mas o simples fato de não querer ouvir gritarias ou palavras como “você não vai sair de casa até completar trinta anos” a deixou bem chateada para voltar para casa em um dia bonito. Sol em dia de inverno é um sol ainda mais bonito que no verão. Não arde tanto, e a possibilidade de ter uma tempestade repentina era nula. Quase não chove no inverno. E quando chove, é uma chuva fina e fria.
        Precisava de um refugio onde poderia almoçar em paz. Pensou ir atrás de Bruna. Talvez se corresse a alcançaria. Ao pensar nisso encontrou com uma amiga da escola, a Bárbara. Uma garota de dezoito anos, de corpo torneado, pele branca, cabelos negros abaixo dos ombros, lisos e quando o sol bate parece incendiar todo um planeta por seu imenso brilho e força. Com óculos de sol com hastes brancas, que combinam com a cor da pele. Vestia um pequeno biquíni branco com detalhes negros. Por onde ela passava chamava atenção. Uma mulher linda de tirar atenção de qualquer ser humano, independente de idade e sexo. Amiga de confidencias de Luciana. A única que sabe da paixão de Luciana pela professora Julia.
        Bárbara viu a amiga e gritou:
        - Piranhuda!
        - Gostosona! Eu estou morrendo de saudade de você.
        - Como saudade, a gente se vê quase todos os dias.
        - Mas eu te amo, sua puta.
        - Você me ama e ama a torcida da seleção brasileira toda, não é?
        - Um pouco mais de gente.
        - E aí, perdida?
        - Perdida estarei quando chegar em casa.
        - Então nem vai. O que você ia fazer lá?
        - Comer. Estou com fome.
        - Vem comigo, a gente come em casa e depois vamos jogar um vôlei de praia.
        - Vamos, mas tem que ser perto de um quiosque que eu marquei com uma garota.
        - Desistiu da professora e vai pegar outra?
        - Ah! Você não sabe de nada. Um que não vou pegar a menina. Bem, não pretendo agora, mas quem sabe depois. Ela é bem bonita. Eu posso até apresentar para você.
        - É. Pode ser. Quanto mais, melhor.
        - E outra. Novidade. Eu beijei a Julia.
        - Mentira? Menina! Conta tudo.
        - A encontrei na praia de noite. Estava o Gu, ela e eu. Daí eu arranjei uma forma legal de tirar o Gustavo da praia. Daí, quando vi que não tinha ninguém por perto eu dei um beijo bem dado nela.
        - E aí? Qual foi a reação dela?
        - Ficou parecendo perdida. Ela não esperava, mas tenho certeza que gostou. Você vai ver, ainda levo aquela mulher para cama.
        - E quando você vai terminar com o Gustavo?
        - Terminar com o Gu? Nunca. Eu gosto dele.
        - Mas você gosta de mulher.
        - Mas o Gu é a minha mulherzinha. (risos)
        - Você não presta.
        - Eu gosto dele. É todo certinho, meio chato, mas eu gosto de ficar com ele. Sinto-me protegida perto dele.
        - Eu não entendo você, mas um dia você vai ter que escolher. As mulheres ou o Gustavo.
        - Eu quero tudo. Pois só quem quer tudo consegue ser feliz.
        - Já disse que você é louca?
        - Uns milhões de vezes.
        - Amiga, eu te amo.
        - Também amo você.
        - Vamos comer, mulher.
        - Vamos.
        Elas foram para casa de Bárbara, fizeram um sanduíche, comeram, riram e resolveram voltar para a praia. Já foram para o ponto onde Luciana marcara com Bruna. E a moça estava lá. As duas atletas iam jogar vôlei e levaram Bruna até onde estava a rede. Luciana tirou o tênis e foi aquecer. Bruna falou que estava com o celular e que iria ligar para Monise. Luciana pediu para fazer isso logo.
***
Bruna, Monise e Luciana
        Luciana olha Bruna ao telefone com um sorriso ansioso no rosto. Bruna procura o número da menina no celular. Bárbara fica perto de sua amiga e olha com muita atenção as pernas da moça com o celular. Até que o telefone toca na casa de Monise. Esta não atende. Bruna olha para Luciana que já a pede tentar novamente. O telefone toca. Monise atende. A moça diz que estava tentando ligar para Luciana, mas ela não atende. Bruna sorriu e disse sobre o paradeiro da menina que nunca carrega celular consigo. E a chamou para ir até lá. “O dia está lindo”, Bruna fala para dar vontade para a nova amiga ir até a praia. As duas desligam o telefone.
Lu:    - E aí? Ela vem?
Bruna: - Vem sim. Relutou um pouco, mas eu acho que ela quer te ver. (risos)
Bárbara:- Luciana arrasa os corações das meninas.
Lu:    - E dos meninos também, ta. Não esqueça disso.
Bruna: - Dos meninos e das meninas? Como é isso?
Lu:    - O coração dos meninos eu me refiro aos caras que eu nem presto atenção, mas sei que olham para mim, e o do meu gatinho Gu. Tadinho. Estou com saudade dele.
Bárbara:- E as meninas são todas as amantes e casos dela. Você acredita que ela namora um homem e caça as meninas?
Bruna: - É estranho para mim, mas não duvido de nada.
Bárbara:- E dessa aí nem deve duvidar de nada mesmo. Quando eu acho que impossível acontecer algo, ela vai lá e faz. É uma espécie de pára-raios e coisas inacreditáveis. Ser amiga dela é nunca morrer de tédio.
Lu:    - Não exagere, Babi.
Bárbara:- Exagerar? Você que é exagerada.
Bruna: - Por que você namora um garoto?
Bárbara:- Está é a pergunta que não quer calar.
Lu:    - Porque eu gosto dele. Ele me faz me sentir segura. Ele é honesto, educado.
Bárbara:- E seus pais gostam dele.
Lu:    - Se fosse por causa de meus pais eu já teria terminado com ele. Nunca que faria algo só para agradar os outros. Eu faço só o que me agrada.
Bruna: - Vou tentar acreditar em você.
Monise: - Se quiser eu tenho telefone de vários psicólogos e psiquiatras. Já fui a todos, mas se quiser tentar com você.
Lu:    - Moça! Que bom que você veio. E nem vem com esta de psialgumacoisa. Estou feliz assim como eu sou.
Monise: - Fico contente por estar feliz Eu peguei a conversa andando. Mas eu entendi o que eu ouvi? Você namora um homem?
Bárbara:- E fica com mulheres e é apaixonada pela professora.
Monise: - Você é bissexual.
Lu:    - Eu não gosto de rótulos. Eu faço o que eu quiser. Fico com homem, mulher, pepino, jabuticaba. Eu não me importo. Faço qualquer coisa para ser feliz.
Bruna: - Acho que vou tentar aprender com você.
Monise: - Eu também.
Bárbara: - Eu não. Ela é louca. (risos)
Lu:    - Eu também te amo, Babi.
Bárbara: - E aí. Vamos jogar vôlei?
Bruna: - Meu esporte é outro.
Monise: - O meu também.
Lu:    - O que vocês praticam?
Bruna: - Lançamento de mulher na cama. (risos)
Monise: - Dardo e vou começar esgrima.
Lu:    - Eu pratico cuspe a distancia. Vamos ver quem ganha? (risos)
Bárbara: - Vamos jogar.
Lu: tem gente jogando. Vamos entrar na de fora.
Monise: - Tudo bem, desde que eu não jogue.
Bruna: - Também.
        As duas atletas jogam enquanto as outras duas ficam perto assistindo. Conversam muito sobre esta situação. Situações ruins as levaram para um bar distante de casa. E a partir disso, na tarde seguinte estavam ali conversando, como fossem velhas amigas. Uma sintonia total. “Deus escreve certo com linhas tortas”, disse Bruna, apesar de não ter certeza se Deus existe ou não. Talvez sim, pois o acaso não parece tão forte para juntar cinco garotas diferentes. Monise esboçava sorrisos mais sinceros. Achava graça de Bruna, mas não parava de olhar Luciana jogando. Algo que ela não conseguia explicar fazia prestar atenção na atleta. O jeito de sorrir, falar, olhar. Ou até mesmo o jeito desengonçado de falar com as mãos e tentar se expressar de forma sempre contente. E o seu jeito, agora inédito, apara seus olhos de jogar. Com atenção, força, vitalidade e alegria. O que faz Monise olhar tanto para Luciana? E pensar nela também?
        Bruna nem lembra neste momento de Cássia. Talvez só exista uma cura para a tristeza, a alegria que uma amizade pode trazer. Ao pensar em amizade, lembrou de Lígia. Lígia… Lígia… Lígia… Pensou tanto que falou o nome dela sem querer.
        - Lígia.
        Monise a olhou e estranhou o nome.
Monise: - Lígia? Quem é?
Bruna:  - Minha ex-amiga. Ela hoje me agarrou a força.
Monise: - Ela é bonita?
Bruna: - Muito. E daí?
Monise: - Então não ache ruim. Ela te machucou?
Bruna: - Ela ficou com minha namorada.
Monise: - Ela ficou com a sua namorada e depois te agarrou a força? Safada.
Bruna: - Muito. Mas ela disse que me ama. Pediu perdão. Eu não sei, mas mexeu comigo, assim como o pedido de perdão de minha namorada, quer dizer, ex-namorada.
Monise: - Você está mexida porque você ainda as ama. Chamou até a ex de namorada.
Bruna: - O ruim de ficar magoada com alguém que você ama é porque fica dentro de ti a saudade também. E a saudade é pior do que qualquer magoa, mas a magoa não deixa você perdoar. Você não a vê, não fala com ela, coloca na cabeça que é melhor viver sem ela, mas a saudade muda suas idéias. E quando você a vê sem querer tem vontade de puxar e gritar “eu estou aqui e ainda te amo, porra”!
Monise: - Complexo.
Bruna: - Difícil.
Monise: - É o amor, né?
Bruna: - Pois é.
Monise: - Por que o amor é assim?

Bruna: - Não sei. Queria muito as respostas sobre o que sinto e o que vou sentir, mas é difícil.

Lu:    - Qual é a fofoca, meninas gostosas?

Monise: - O papo é sobre amor.

Bruna: - O amor e os problemas que ele traz.

Lu:    - Eu não sou a pessoa mais romântica do mundo e talvez a ultima que deveria falar algo sobre isso, mas eu acho que quando o amor vira sofrimento, ele deixa de ser amor. Ou talvez nunca tenha sido amor de verdade. Apenas uma ilusão chamada paixão.

Bruna: - Eu não sei se concordo com você. Eu amo a Cássia e ela me machucou e isso está me trazendo sofrimento. Sofro não por causa do amor, mas pela a falsidade dela.

Lu:    - Se você a ama tanto deveria perdoar.

Bruna: - Mas ela me traiu.

Lu:    - Mas foi só beijo na boca, ou sexo. Uma coisa é o que você tem por dentro e outra coisa é sexo. É coisa de pele que elas tiveram. Normal. Às vezes o grande amor da nossa vida não é a pessoa que queremos transar o resto da vida, mas sim a pessoa que queremos ter por perto para conversar, fazer cafuné e nos fazer sorrir.

Monise: - Faz sentido.

Bruna: - Mas dói.

Lu:    - Dói porque vivemos em um mundo individualista e egoísta, onde nos ensinam que as pessoas que amamos nos pertence. Não é assim. As pessoas pertencem a si mesmas.

Bruna: - Eu não sei. E a Lígia? Ela disse que ficou com a Cássia por amor a mim. Devo perdoá-la?

Lu:    - Eu acho que a pior traição é a do amigo. Eu não sei opinar sobre isso. Pode ser a pior desculpa do mundo, mas pode ser verdade.

Monise: - Se ela foi até a sua casa para falar isso, eu acho que pode ser verdade. O que ela ganha para mentir?

Bruna: - Minha amizade.

Monise: - A questão não é essa. Se você não valesse de nada para ela, ela não correria atrás de você. Ela errou. Elas erraram, pois traíram a sua confiança, mas o perdão é o maior presente que podemos dar a uma pessoa.

Lu:    - Mesmo que depois a gente enxergue que ela não mereça nosso amor e carinho. Nosso perdão e compreensão. Você tem que ser superior em seus gestos.

Bárbara: - Não acredito que a peste está dizendo coisas tão bonitas e inteligentes.

Lu:    - Nem eu acredito muito nisso, Babi.

Monise: - É porque ela não é peste.

Bárbara – É porque você não a conhece tão bem quanto eu.

Monise: - Mas eu conheci o olhar dela. Ela é uma menina levada, mas tem um grande coração. Nada de peste. Está mais para anjo.

Lu:    - Obrigada pela defesa, mas não exagere. Anjo? Nossa. Foi demais, agora.

Bruna: - Não importa o que ela é, e sim o que ela faz com a gente.

Lu:    - O que eu faço? Ainda não fiz nada.

Monise: - Como não?

Bruna: - Isso aí. Como não?

Monise: - Você é apaixonante. Sua alegria contamina a gente e pelo menos comigo, me ajuda a pensar em viver melhor, a tentar ser feliz. O mais importante, a querer a tentar ser feliz. Você fez até agora que um ano de analise conseguiu.

Bruna: - Concordo com a Monise. Estar perto de você é olhar em tudo que está em nossa volta e ver que temos chances de ser feliz. Você é incrível.

Bárbara: - Vocês não sabem o que estão fazendo. Deixando esta menina mais metida do que já é.

Lu:    - Não vou ficar metida com isso, pois mais do que já sou é impossível. Mas vou ficar emocionada. Aliás, já estou. Nunca ouvi palavras tão doces sobre mim, e ainda vindo de pessoas que eu mal conheço.

Bárbara: - A sua presença é marcante, amor.

Lu:    - Obrigada.

Bruna: - Que isso. Precisa agradecer não.

Monise: - Eu que tenho que agradecer.

        O tempo corre mais rápido que podemos imaginar. Quando imaginamos que acabamos de acordar, está na hora de deitar. E nesse pique-pega alucinante da vida, vai chegando o inicio da noite. A conversa das meninas tem um tom agradável e tão bonito como pôr do Sol. As quatro caminham. Fazem planos. Falam sobre seus sonhos e medos. E os desejos de cada uma fica estampado em seus rostos. O desejo de um amor. Desejo da felicidade. E o desejo do perdão. Todos estes desejos desembocam em um só, o de ser feliz. Como se busca a felicidade? Como se encontra a felicidade? Cada um tem seu modo. E esquecem que a “tal felicidade” nunca pode ser alcançada como uma linha de chegada. Felicidade é um estado de espírito e não um objetivo.


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Olá, lhes peço perdão pela a demora. É que eu estava muito bem ocupada. Digamos que, uma ótima ocupação, caso alguém aí consegue compreender.
Espero que tenham gostado do capítulo.
Beijos

Um comentário:

NatyL disse...

Eu não me canso de ler a historia é muito boa, ainda estou nos primeiros capítulos, porém ansiosa pra continuar lendo sempre, beijos, amei :D